Depois de muito tempo sem escrever, eis que me peguei novamente com vontade de digitar algumas linhas. A razão, como o título deste texto bem mostra, foi o novo filme de Walter Sales, que, com uma atuação brilhante da atriz Fernanda Torres, trouxe pela primeira vez na história um Globo de Ouro de atuação para o Brasil. Para um ator e diretor de Teatro como eu, ver alguém do nosso país atingir esse patamar é algo de fazer chorar de alegria; e chorei.
Fernanda tinha diante de si nada mais, nada menos do que Angelina Jolie, Nicole Kidman, Kate Winslet, Pamela Anderson e a impagável Tilda Swinton, o que tornou a vitória algo de simplesmente homérico, visto que, se entregue a qualquer das seis candidatas, o prêmio estaria muito bem entregue, dada a potência cênica oferecida por essas seis espetaculares atrizes.
O roteiro do filme de Walter Sales, que inclusive ganhou o prêmio máximo no Festival de Veneza, tem grande participação no troféu entregue a Fernanda Torres, uma vez que valoriza uma atuação "econômica", cirúrgica, eu diria, que Fernanda soube entregar com maestria. Fernanda Montenegro, mãe de Fernanda Torres, entregou 25 anos antes uma interpretação que também merecia tal premiação, ainda que eivada de uma veia tragicômica, o que fazia da Dora, de "Central do Brasil", uma personagem que oferecia muito mais recursos a uma atriz em busca do Olimpo da intepretação cinematográfica. A Eunice Paiva de Fernanda Torres tinha bem menos recursos a oferecer à interpretação desta atriz, o que torna a premiação ainda mais elogiável.
O filme é sobre família, sobre resiliência, sobre luta, resistência, democracia e direitos. Mas, ainda que pudesse ser um panfleto político a ser usado como um "tapa na cara" da ditadura militar, que nos assolou por 21 anos, a película de Walter Sales não se apresenta como uma "vingança", como um insulto ou um "troco". Tanto assim é, que esse filme, apesar de muita propaganda contrária - inclusive pregando boicote ao filme, por parte dos adeptos da extrema-direita brasileira - conseguiu algo que apenas o esporte tem conseguido nos últimos anos; unir um país com um sentimento de orgulho, de pertencimento, de irmandade mesmo.
É claro que isso preocupou a extrema-direita brasileira, pois, para esta, a polarização interessa mais do que tudo, uma vez que qualquer elemento a pacificar e unir os brasileiros em torno de um único propósito ou sonho já aparece como um fantasma, tal como o "comunismo", o banheiro unissex ou a mamadeira de... ah, deixa pra lá. Os arautos desse espectro político até tentaram diminuir o tamanho da conquista de Fernanda Torres para o Brasil, mas, quando uma pessoa, ainda que simpatizante da ideologia desses mesmos arautos, vai ao cinema, fica com a sensação de que pode estar sendo enganada, dada a força do filme em nos carregar, sem qualquer espírito de revanchismo, a um ponto comum, a algo ou algum lugar que nos faz bons, solidários e próximos de novo.
Não sei se o Oscar vem dessa vez, pois são outros votantes e muito dificilmente a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas estadunidense premiaria uma pessoa falando em língua não inglesa. De todo modo, vale a torcida por Fernanda, que, tendo desbancado Jolie, Kidman, Winslet, Anderson e Swinton, só precisaria levantar a cabeça e encarar de frente, e com toda dignidade e altivez de uma grande atriz, a convincente e maravilhosa atuação da Demi Moore.
liberdade, beleza e Graça...