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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

terça-feira, 31 de outubro de 2017

"500 anos da Reforma Protestante"

Analisar o cristianismo no Brasil acabou sendo, por muito tempo, separar católicos de evangélicos, e só. Todavia, é importante lembrar que aquilo em que se tornou o protestantismo no país, o mundo evangélico, em quase nada se assemelha àquilo que se iniciou no século XVI, e que acabou por se tornar um dos pilares da Modernidade, a saber, a Reforma Protestante. Qualquer simples trabalho de campo mostrará que os evangélicos, assim como sua liderança política, no Congresso Nacional ou fora dele, pouco ou nada entendem sobre o movimento que eles têm como matriz religiosa.

A Reforma, cujo estopim ocorreu em 1517, trouxe luz à luta de Lutero, Zwinglio, Melanchton, Calvino, Müntzer e outros reformadores, e é entendida pela Sociologia como um dos três dos mais importantes acontecimentos a trazerem uma nova era para o Ocidente, e para o mundo, juntamente com a instauração do Estado Racional Burocrático, tão bem analisado por Weber, e também com a chamada cristalização do capitalismo de mercado, tão profundamente estudado por Marx.

Se não entende patavina sobre as implicações da Reforma para a sua lida diária na fé, ao menos os evangélicos captaram bem uma das consequências do movimento liderado por Martinho Lutero e suas 95 teses afixadas na porta da Catedral de Wittenberg, na Alemanha. Parecendo, no entanto, agir de forma contrária ao posicionamento verdadeiramente protestante naquilo que Lutero chamou de Disputatio pro declaratione virtutis indulgentiarum, a conhecida disputa sobre o poder e a eficácia das indulgências, isto é, dos pagamentos para se conseguir o perdão de pecados, os evangélicos brasileiros, 500 anos depois de tal revolucionário marco, seguem trocando dinheiro por curas, perdão e salvação de pecados, o que joga por terra a luta dos reformadores acima citados, já que nada disso (cura divina, perdão de pecados e salvação da alma), segundo a visão genuinamente protestante, vem de fora do tripé de tal visão de mundo; só pela Graça de Deus, conhecida pelas Escrituras, e que gera a que move aquele que crê.

Mas, ainda que o movimento evangélico insista em tratar a religiosidade como um lugar de disputa por dinheiro e poder, e usando o nome de Deus para isso - algo que pode ser visto cotidianamente nos programas religiosos e nos ditos de seus mentores, sobretudo pentecostais e neopentecostais, em disputa por "mercado" na tevê - é importante lembrar que a religiosidade proposta pela Reforma Protestante tem mais implicações seculares do que propriamente "sagradas", visto que é a visão sobre o verdadeiro papel da religião e da economia monetária que está em jogo, uma vez que a visão protestante descentraliza o medo de Deus e retira a "maldição" que existia no dinheiro, algo que a igreja insistia em ter em suas mãos, já que nas mãos do povo poderia lhes tirar o paraíso, problema que a instituição igreja não teria, já que ter dinheiro e terras não seria problema (somente) para ela. 

Assim, o que de melhor se pode focar nesse aniversário de 500 anos é que a Reforma trouxe a autonomia para os indivíduos que querem professar, à sua maneira, o seu cristianismo, além do apoio à livre interpretação das escrituras bíblicas, retirando tal monopólio das mãos do clero, ao mesmo tempo em que tornou o indivíduo livre para destronar lideranças que insistem em deter o verdadeiro sentido dos escritos tidos como sagrados pelos cristãos. Afinal, se Deus realmente existe e ama o seu povo, por que não derramaria graça sobre aquele ou aquela que sinceramente busca uma inspiração na Bíblia para re-significar sua existência na terra, desde que respeitando o contexto e a intenção originais do escrito? 

liberdade, beleza e Graça...



domingo, 15 de outubro de 2017

"Eu sou professor!"

Sou professor desde 1997, mas chegar ao dia 15 de outubro sempre me foi muito normal e nunca nada de muito excepcional me aconteceu por conta de tal data. Todavia, um insight nunca antes tido me veio no dia do professor deste 2017. Para além do simbolismo de 20 anos de docência (não, não sou velho; comecei a dar aulas de teatro antes mesmo de me formar! rsrs), olhei para meus alunos e percebi que eles me escutam muito, me levam a sério demais, valorizam demais o que falo, o que penso e o que ensino. Onde vários colegas enxergam alunos desinteressados e bagunceiros, só vejo olhos vidrados, sendo que isso sempre me pareceu muito normal. Percebi também que tenho um papel de muita responsabilidade na vida desses caras, além do fato de eu ser considerado um bom professor por eles, o que sempre me honrou, mas nunca recebeu tanta importância de minha parte, já que, para mim, ser bom professor é uma coisa "normal". Só que não.

Um amigo meu me disse uma vez que "encontrar um bom professor é encontrar um tesouro". É verdade. Eu encontrei alguns, mas nenhum que se compare à dona Ana Verônica Pardo, aquela por causa da qual eu sou doutor hoje. Afinal, como agradecer a uma figura que olhou para o pior aluno da classe e o fez se tornar o melhor? Que mágica tinha aquela mulher? Nenhuma. Não era mágica. Era olhar. Assim como Jesus, o milagre não está na mágica feita, mas no olhar que enxerga a invisibilidade social de alguém, trazendo-o para o Caminho, retirando-o da margem, evitando o marginalizado.

Ganhei um livro. A ex-aluna fez uma dedicatória. "Você foi o melhor professor que eu já tive na vida". Sim, o dia do professor de 2017 foi simbólico, e não apenas pelos 20 anos completados, mas porque, pela primeira vez na vida, eu me senti como a dona Ana, quando eu tinha apenas 8 anos de idade. Eu consegui também fazer o milagre! Sem nada que fizesse menção à questão da sexualidade, me tornei Ana, Ana Verônica; me tornei professor! E, apesar de a mais importante profissão que existe não ter nem um décimo do valor que deveria ter, tenho a maior honra e o maior orgulho de hoje afirmar categoricamente que eu sou professor!!

liberdade, beleza e Graça...