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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

sábado, 20 de novembro de 2010

"Cristianismo: a melhor possibilidade de se atualizar Marx"

Concordando ou não com o seu posicionamento ideológico, todos sabemos que é inegável a enorme importância da contribuição de Karl Marx para o pensamento crítico contemporâneo nas mais diversas áreas do conhecimento. Tanto na Economia quanto na Filosofia, na História e nas Ciências Sociais, as ideias marxianas conseguem ainda encontrar espaço privilegiado nos debates acadêmicos e em outras rodas em que se interessam por pensar o modus operandi do sistema capitalista selvagem em que nos metemos. Em épocas de crises econômicas, como a que atingiu o mundo em 2009, isso fica ainda mais evidenciado e a obra de Marx é acessada até vorazmente.
No entanto, excetuando-se aquela que seria conhecida como a Teologia da Libertação, a única esfera onde o tal pensamento marxiano sempre pareceu não encontrar muita aceitação foi a esfera religiosa. Talvez por culpa do próprio Marx, que - não atentando para o forte poder da religião na mobilização das massas contra a opressão do Estado e do capitalismo e para o poder de sociação de algumas denominações religiosas em relação a grupos socialmente excluídos - taxou a religião como simplesmente "o ópio do povo", pois algo que só faria alienar os grupos de explorados, que não lutariam contra os seus dominadores, por conta de algo que seria para Marx um "posicionamento castrador" inerente à religiosidade.
Com a mesma ideologia de Karl Marx, mas com um olhar mais atento para as religiões e sua inegável contribuição na luta contra a opressão, Friedrich Engels, Rosa Luxemburgo e António Gramsci apresentaram textos onde a religiosidade fugia à afirmativa em princípio bastante reducionista que Marx legou à humanidade. A religião veio então a ser apresentada como algo para além de um simples "anestésico" para os dramas de uma humanidade permeada por desigualdades de toda natureza.
Ao arriscarem uma comparação entre o comunismo e o cristianismo primitivo, tais autores conseguiram fazer a aproximação que Marx não conseguira e possibilitaram, por esse gesto bastante solidário e delicado, uma abertura que fomentaria o pensamento marxiano como praticamente sinônimo do cristianismo strictu sensu. Se num âmbito mais latu o cristianismo passou nos últimos anos a ser uma faceta religiosa do capitalismo alienador - vide a "Teologia da Prosperidade" neopentecostal -, o tal cristianismo strictu sensu, o chamado cristianismo primitivo, conseguiu ser exatamente o que Karl Marx apregoaria como sonho para uma humanidade realmente humana, pois comunista: todos teriam tudo em comum e não haveria quem escravizasse os outros, numa hierarquização opressora, pois todos lutariam pelo justo, pelo bom e pelo melhor do mundo.
Embora países ocidentais hegemônicos tenham fomentado uma luta entre o bem e o mal, taxando o comunismo de mal, já que eles, os hegemônicos capitalistas, seriam "do bem", a lógica do individualismo e da luta de todos contra todos no sistema de acumulação e de propriedade privada dos meios de produção só fez gerar algo que nunca esteve tão distante da cosmovisão do Cristo. Portanto, se a tal apelação para a esfera espiritual pudesse ser acessada para a justificativa de algo que é totalmente terreno, o capitalismo estaria muito mais distante do ideal cristão do que o comunismo, pois este último seria na verdade a própria expressão da ética do Cristo: para cada um conforme a sua necessidade e de cada um conforme a sua capacidade. Os que podem mais, contribuem mais e o que necessitam mais, recebem mais. Nada mais cristão.
O que vemos, pois, é que, embora possa parecer contraditória e totalmente descabida, a máxima que dá título a este escrito consegue se fazer justificar. Afinal, se o verdadeiro cristianismo é uma religião ao redor de uma mesa, onde todos podem ter o mesmo pedaço de pão, se tornando cumpanis - do latim, "com quem você come o pão" -, quem melhor do que os comunistas para nos ensinar o abrasileiramento da palavra companheiro?

liberdade, beleza e Graça...