Quem sou eu

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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

segunda-feira, 27 de julho de 2015

"De volta pra casa"

Depois de 3 anos, lá estava eu novamente no interior de São Paulo, onde fui criado até o final da adolescência. Falar em 3 anos é falar em pouca coisa, eu sei, mas dessa vez foi diferente, e três anos se tornaram em décadas, já que decidi fazer uma viagem no tempo em sentido bastante amplo; a ideia era visitar gente que eu não via desde o início da adolescência, já que tenho tios, tias, primos e primas que não me viam desde os meus 15 anos de idade.

Chegar e perceber-me tio já foi algo sensacional. Carlos Henrique tem dois anos e é um sobrinho lindo e inteligente. Fã inveterado dos palhaços Patati e Patatá, ganhou o Patatá em tamanho gigante, já que tem o Patati, dado pelo pai, meu irmão Fernando. Ver uma criança eufórica, tentando retirar um palhaço quase que do seu próprio tamanho de uma caixa colorida é algo impagável. Mais impagável ainda é ver que, após abraçar o palhaço, o menino corre e até se esquece do recém-conhecido tio e do mundo todo que o cerca. O Patatá é o foco e o Henrique tem toda a razão de pensar assim. Eu também faria isso.

Descobrir tios e tias encurvados pela doença e pela idade também faz refletir sobre o tempo e a vida. Outrora estavam com muito vigor e davam as ordens e as motivações para tudo e todos. Hoje, precisam da gente. Precisam de gente. Precisam de filhos, de sobrinhos, de netos. O tempo não poupa ninguém. De repente, uma geração de cabeças-brancas; gente que outrora tinha como que carvão na cabeça, de tão pretos que lhes eram os fios. O tempo passa. Judia da gente, eu diria. 

A paixão da adolescência já é uma respeitável senhora. Casada, mãe de filho e muito bem colocada socialmente. Hora de todo o platonismo se dissipar. Tudo o que nunca foi também já acabou. O bom é saber que, se você amou e não teve, ao menos quem teve tem boa índole e cuida bem, assim como era o sonho seu, jamais realizado. Ela está bem e parece muito feliz. O marido é bonito, bem-sucedido. O filho puxa a ambos. Família feliz, eu acho. Parece, sim.

A vida deu certo para alguns. Deu errado para outros. Muita burrada foi feita. Acertos também. Burradas marcam mais. "É sua filha?". "Não, é minha neta; filha da minha filha". "Mas sua filha já tem idade para ter filha?!". "Não". (Nem sei porque faço certas perguntas. Deveria ficar calado). Sim, tenho primas de terceira geração; filha da filha da minha prima. O tempo é duro e a falta de oportunidades e as muitas escolhas também nos cobram caro. 

Estou bem e todos elogiam e se orgulham. Mas o desterro é irreparável. Não choro mais ao entrar em São José do Rio Preto. Não sinto mais que estou voltando pra casa quando visito a cidade. Apenas percebo o tempo. Ele passou. Passa e a gente não vê. Volto pra Vitória, que também não é entendida como casa, como lar. Errante pelo mundo, tento encontrar lugar e "fazer deste lugar o meu lugar", como diria a minha amiga Zélia Duncan. Mas o desterro é inevitável. Voltar? Não. Quem era amigo hoje nem reconhece; as referências todas mudaram. Nenhuma grande referência permaneceu incólume pelo tempo. Tudo mudou. Voltar seria estar num outro lugar, não na Rio Preto que me viu crescer. Um homem sem lugar, fora do lugar. Voltando pra casa depois de 8 dias? Nada. Voltando pra rotina. Desterrado não tem casa. Como diriam os Titãs: "Eu sou de qualquer lugar. Eu sou de lugar nenhum".

liberdade, beleza e Graça...