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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

"Da razão de Brumadinho explicar a tragédia brasileira"

Quando a barragem da mina do Córrego do Feijão rompeu em Brumadinho, veio à tona a tragédia anterior, da Samarco, em Mariana, trazendo luz a uma questão que, por mais que muitos queiram ter como ultrapassada, é o que continua a ditar as regras no país, bem como o que explica a tragédia brasileira; a luta de classes. Isso porque o que está em jogo são os interesses econômicos dos grandes empresários brasileiros e estrangeiros, contrapostos ao interesse da sociedade e dos trabalhadores, o que tende a dificultar fiscalizações idôneas, respeito ao meio ambiente e, no pior dos casos, fomentar um tremendo desrespeito à vida, como no caso das quase 400 pessoas mortas na tragédia provocada pela barragem de rejeitos de minério da mineradora Vale. 

O que poucos buscam saber, no entanto, é como fazer para que a tragédia não mais se repita e, mais ainda, como fazer para que as pessoas atingidas sejam indenizadas, já que, após 3 anos do desastre em Mariana, nenhum morador foi indenizado, estando todos alocados em casas alugadas e recebendo apenas um valor mensal que nem de longe se compara ao que legalmente seria uma indenização pelas perdas provocadas. Ainda assim, nenhum responsável está preso e não se percebe qualquer preocupação com as vítimas, já que os bilhões de reais em lucro da empresa Vale nos últimos anos, mesmo após Mariana,  e os 200% de valorização das ações da empresa parecem importar muito mais do que as vidas perdidas, o meio ambiente devastado e as histórias enterradas na lama.

Talvez a Vale tenha uma postura diferente agora, visto se tratar, no caso da maioria das vítimas, de funcionários seus, o que pode fazer com que a situação corra de forma diferente, já que as 19 mortes de 2015 não conseguiram sensibilizar a empresa, que pouco fez para que a tragédia não se repetisse, focando muito mais na tentativa - exitosa, diga-se - de reconstruir sua imagem e, com isso, continuar sua busca desenfreada por lucro, ainda que nessa busca esteja presente a atitude de ignorar avisos de novas tragédias, tal como a investigação já mostra no caso de Brumadinho.

A verdade que surge, então, é que pouca coisa consegue explicar mais a tragédia brasileira do que o embate que se estabelece entre empresariado e trabalhadores. Tanto que temos agora um governo que, antes da tragédia de Brumadinho, afirmava que "a fiscalização deveria ser flexibilizada", já que tal postura "atrapalha a vida de quem quer produzir", nas palavras do próprio presidente da República, Jair Bolsonaro. É claro que, após o ocorrido em Brumadinho, o governo correu para, de forma muito oportunista, negar o que tinha pregado antes, visto que o ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, chegou a afirmar que, no caso de situações de alto risco a fiscalização deveria ser bem mais rigorosa, posicionando o governo de forma incoerente em relação ao que vinha antes defendendo. 

Ao fim e ao cabo, estamos diante de um governo que prestigia empresas como a Vale, retirando delas o ônus do rombo na Previdência Social - já que as empresas, devedoras de bilhões em impostos, são as maiores responsáveis pelo rombo que a classe política e a mídia noticiam diuturnamente - e cobrando tal ônus na vida dos trabalhadores brasileiros, algo que o governo também já vem fazendo em relação ao agronegócio, que terá bilhões em dívidas perdoadas, uma vez que "não podem ser atrapalhados de produzir e precisam ter o governo longe do seu cangote", como também defende Bolsonaro, presidente que, pelos discursos e posturas, em 4 anos fará com que o rico cada vez fique mais rico e o pobre cada vez fique mais pobre, sendo que a justificativa ainda será algo parecido com o "é pobre porque é preguiçoso e não quer trabalhar", algo típico de quem retira direitos e se posiciona do lado dos mais fortes, do lado de quem já tem a posse do dinheiro e do poder. Triste.

liberdade, beleza e Graça...

     
  

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

"Meu primeiro discurso como patrono de turma"

Em memória de João Vitor Sacconi Guarnier (que deveria estar se formando com a turma, mas faleceu em acidente de automóvel, na metade do curso, para imensa tristeza nossa).

Queridas e queridos estudantes, formandos do Curso Técnico em Mecânica, eu sabia que vocês conseguiriam! Conseguiram! Tenho apenas 4 parágrafos para ler e estou muito consciente de que, nos 5 minutos que me foram concedidos, me seria impossível expressar tudo o que tenho dentro em mim, que vem do fundo do meu coração, e que, por mais que seja fruto de apenas um ano e meio de convivência, é algo mágico e construído com potência suficiente para gerar uma vida que não tem fim; para gerar um instante de eternidade no coração de um professor que não tem outra coisa a lhes dizer nessa noite, senão um "muito obrigado pela honraria que agora me proporcionam!". E, se são só 5 minutos, permitam-me encerrar já aqui o primeiro dos meus 4 rápidos parágrafos com a única frase que merece ter presença na relação que conseguimos construir, e que ganha ápice nessa noite tão especial de festa, de conquista, de vida e de luz: EU AMO VOCÊS.

Não é fácil dizer isso e talvez eu consiga dizer que os amo hoje porque estamos longe agora. Talvez porque eu não tenha de lhes encarar amanhã ou depois, o que com certeza me faria corar de vergonha diante de cada um, já que eu teria de justificar uma frase que é tão forte, mas tão forte, que a gente às vezes prefere morrer a ter de falar. Mas eu não vou esperar morrer. Na verdade, já esperei tempo demais para dizer a alguém que o amo, que a amo. Então, vou repetir, e sem medo de ser piegas, de ser cafona, de ser ultrapassado; é verdade, sim, minha turma preferida, meus alunos do coração, EU AMO VOCÊS.

A dificuldade que venço agora, dizendo que os amo, tem razão de ser; afinal, de um lado está um medo terrível de expressar afeto, já que se trata aqui, como vocês bem sabem, de alguém que, por conta de um orfanato insosso e sem afetividade, não aprendeu da potência de um carinho, de um beijo sincero, de um abraço que demora; alguém que não foi ensinado a amar. Por outro lado, talvez a distância entre professor e alunos, que é, por muitos, insistentemente solicitada, nos afaste e nos impeça de dizer EU TE AMO. Mas eu os amei desde o primeiro dia, e os amo mesmo, ainda hoje, e com tudo de mim. E os amei desde o princípio porque me via em vocês; uma turma que se parecia demais comigo. Eu parecia fazer parte daquilo. Pareço ainda fazer parte.  Isso me alegra, me honra, me deixa cheio de Deus, me deixa em Deus, en theos, en theos asmos, entusiasmado!

Inicio o meu último dos 4 parágrafos implorando para que vocês não se deixem envelhecer para dizer que amam alguém. Porque tudo vai passar. As ciências que aprendermos aqui, o dinheiro que ganharmos aqui, as conquistas que tivermos aqui. Tudo vai passar. Mas o amor vai ficar para sempre. O amor jamais acaba. Demorei mais de 20 anos de vida de professor para entender que só se consegue ensinar mesmo algo a alguém com amor. Então, que vocês não aprendam a amar apenas no entardecer da vida, como eu, mas já no amanhecer de suas histórias, como agora, no primeiro dia do primeiro ano do resto de suas vidas. Deixo, por fim, a cada um de vocês, o segredo para a felicidade, segredo esse que me deveriam ter contado quando eu tinha 18 anos, tal como vocês têm agora: 1º) desenvolva um senso de pertencimento, sendo amigo, tendo próximos, sendo parte de um grupo; 2º) procure aprimorar as habilidades de fazer alguma coisa muito bem feita, a ponto de as pessoas duvidarem que outro alguém possa fazer tão bem feito como você; e 3º) fortaleça o seu senso de autonomia, que é a capacidade de se aceitar e de se sentir bem com você mesmo. Acredite, vai dar certo; você vai ser feliz. Vocês vão ser felizes. Isso aqui é só o começo de tudo. Muito obrigado.

liberdade beleza e Graça...