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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

"Da postura judaizante de um mundo evangélico perdido"

Um dito popular defende que nada é tão ruim que não possa piorar e nada é tão bom que não possa melhorar. Em se tratando de mundo evangélico brasileiro, tal dizer popular se coloca como verdade absoluta, sobretudo quando se trata da parte onde a tendência é a piora. Digo isso como "profeta-vidente", já que em texto escrito há quase dez anos eu apontava uma gradativa volta evangélica ao judaísmo, justificada na dificuldade do mundo protestante de então em lidar com a doutrina da trindade, optando ou pelo hierarquismo das três figuras divinas envolvidas no processo, ou pela subtração de duas delas.

Tentando explicar melhor; em texto de outrora, defendi eu que o movimento protestante se divide em três categorias, sendo que cada uma delas se apropria seriamente apenas de uma das três pessoas da trindade, uma vez que a dificuldade para lidar com tal dogma sempre colocou a todos em uma situação demasiado desconfortável. Assim, os protestantes tradicionais (históricos ou conservadores, como denominam muitos) se apropriariam da figura do Deus Filho, Jesus Cristo, atribuindo a ele uma proeminência não experimentada pelo Deus Pai e pelo Deus Espírito Santo, sendo tudo feito e pensado "em nome de Jesus". 

Já o movimento pentecostal, se apropriaria de forma singular da pessoa do Espírito Santo, visto que tal segmento é mais chegado à parte mística do crer evangélico, enfatizando dons espirituais, e com grande foco na glossolália, o dom de "línguas estranhas", deixando de lado a religiosidade "fria" do movimento mais tradicional. Os neopentecostais, por sua vez, começavam há mais de uma década um forte retorno ao judaísmo, incluindo nos seus cultos o toque do chofar, a valorização da Arca da Aliança e um foco especial nas conquistas do povo de Israel, sempre apoiado pelo Deus Pai, durante sua peregrinação pela terra em tempos há muito idos.   

Na linha neopentecostal, sua mais conhecida representante, a Igreja Universal do Reino de Deus, liderada pelo bispo Edir Macedo, acaba por mais uma vez ratificar minha "profecia" de outrora; a IURD inaugurou no dia 31 de julho de 2014 a sua versão do "Templo de Salomão", imitando dimensões e características do templo sagrado para os judeus, do qual não resta hoje em Jerusalém sequer uma parede, sequer um muro para lamentações. Em termos arquitetônicos, o empreendimento do bispo é de uma beleza de fazer brilhar os olhos de crentes e incrédulos. Em termos religiosos, todavia, tal empreitada trouxe mais um problema para o pensar e o agir dos evangélicos brasileiros.

Como não poderia deixar de ser, o primeiro a pregar no novo templo foi o próprio Bispo Macedo, surgindo como uma versão fake do rabinato israelita, já que trazia uma longa e branca barba, bem como um quipá na cabeça, mostrando que a caminhada da igreja cristã rumo à Reforma deu uma guinada que coloca Jesus e o Espírito como novos coadjuvantes do Deus Pai, veterotestamentário, dos judeus. Em suma, nada na igreja de Macedo é protestante; tudo lá é qualquer outra coisa, mesmo que a coisa nada tenha a ver com o que queriam os reformadores que Edir Macedo professa seguir, ainda que de longe. 

O problema de tudo isso é que os judeus não aceitam o que a IURD fez, bem como não reconhecem como de Salomão o que foi construído no bairro do Bráz, em São Paulo. Assim, sem o apoio do mundo protestante, já que a igreja do Bispo Macedo não caminha por tal senda luterana, sem a simpatia judaica, já que tal réplica de templo poderá até ser chamada de uma profanação religiosa, e sem o apoio católico, já que o chute na santa jamais será esquecido, restará a Macedo e seu séquito uma linha religiosa única no Brasil de todos os santos. A se seguir tal tendência, não será absurda a ideia "macediana" de um céu da Universal aqui na terra. Nesta futura versão megalomaníaca do Bispo, teremos ruas de ouro a cobrir alguma metrópole brasileira, bem como portas de pedras preciosas e outros adereços apresentados no livro de Apocalipse. Conseguindo isso, enfim, Macedo terá alcançado a "imitação do céu". Quanto a nós outros, que não compactuamos com as loucuras do Bispo, experimentaremos em breve, e já aqui na terra, a terrível presença do inferno.

liberdade, beleza e Graça...    


11 comentários:

Liana disse...

Que loucura! Em se tratando da fé evangélica, essa é uma demonstração da confusão nossa de cada dia... mas a Universal nem evangélica é... É de torcer os miolos! Mas seu texto foi excelente em distorcer "friamente"... rs.

Anônimo disse...

O que me assusta é que a "imitação do céu" para o Edir Macedo está sempre ligada ao seu império e patrimônio. Parece que ele se associa à representação de um Deus, de forma que obtém bens cada vez mais imponentes para se sentir “soberano”.

Cleinton disse...

Acho, Liana, que até é evangélica, pois neste rótulo está cabendo de tudo. Mas tenho certeza de que não é protestante! Um abraço.

Liana disse...

Evangélico não estaria restrito à pregação do evangelho? Mas entendi...rs

NELSON LELLIS - COPEIRO DO REI disse...

A ideia de uma sistematização da fé, inserindo os símbolos rituais, cúlticos da base da religião cristã (judaísmo, que vem de outras bases), é o modelos característico da IURD. Se se tira isso, acaba-se o circo. O modelo econômico que o Primeiro Testamento estabelece para a manutenção do culto é óbvio. Custava muito "caro" manter um culto em Israel. Sem apresentar níveis de importância, vemos que a celebração, os votos, os pagamentos pelo pecado, encareciam as reuniões sacrificiais. Depois, a participação nos impostos a fim de manter relações/alianças políticas com nações mais fortes garantindo, assim, expansão territorial e/ou a segurança em terra "própria".
Quando, porém, observo o interesse pelos símbolos do Primeiro Testamento, me é claro a presença estrutural do pensamento religioso da escravidão e da perpetuação do homem em sacrificar pelos seus erros, bem como uma vida como moeda de troca na manutenção da IURD.
Incrível é que a coisa é escancarada, mas ninguém quer ver.
Parabéns, amigo.

Lellis

Unknown disse...

Temos nos distanciado da paixão de pensar,de compreender,de questionar de modo livre e lúcido,organizado e produtivo à nossa realidade.Procuremos nos informar mais ou seremos cada vez mais "vítimas" de nossa própria ignorância.Onde homens que se auto intitulam "de Deus" se aproveitam de uma população carente (em todos os sentidos) .Principalmente carentes de conhecimento.

Edmilson Nunes Soares disse...

Nas suas diversificações doutrinárias, cada uma busca uma fatia do mercado cada vez mais competitivo. neste mundo capitalista exacerbado ocidental.
Somente numa coisa são unânimes: dízimo de dinheiro. Nisto não há discordâncias.

Anônimo disse...

Essa demonologia da prosperidade... Está cada vez mais difícil identificar que pastor/instituição tem pregado de fato o evangelho de Jesus. Depois de criar o "céu do Macedão" ele vai querer criar o evangelho segundo Macedo rs. A realidade da igreja como instituição está NOJENTA. Experiência: "Domingo só não sai na hora da pregação, em consideração ao meu pai(dia dos pais), o pregador metido a cantor leu a Bíblia falou sobre o texto uns 10 min e começou a cantar, revelar, e dizer para as pessoas que elas tem a cara do carrão, de uma bela casa, e outras coisas." Isso me dá nojo...a parte que mais gosto do culto não teve, que é a Palavra. Assim não dá. Mercado gospel é bem rentável, e é isso que virou as instituições religiosas, vende-se de tudo, água ungida, até vassoura ungida,fazemos qualquer negócio. É com razão que fazem chacota conosco, evangélicos que não fazem diferença no mundo. Mas, ainda tenho fé, esperança...

Edna (sua aluna na faculdade Unida)

Unknown disse...

De fato aqueles que se declaram protestantes estão profundamente incomodados pois o Bispo Macedo usa de toda sua autoridade e liderança para articular e colocar em prática suas ideias e ideais, para fins que não se adquadam aos princípios que seguem os evangélicos os Católicos. A verdade é que para o senso e liderança comum o cara é um grande líder um mero articulador de pessoas, mas para a Liderança Cristã passa muito distante de como conduzir aqueles que crêem em Cristo e em seus ensinamentos. Parabéns Cleinton pelo Artigo.

Anônimo disse...

Muito bom texto! No seu lugar lenbraria de relacionar juntamente com a IURD as milhares de pequenas grandes empresas religiosas "protestantes" que descaradamente oferecem, céus, curas, carros, apartamentos e sugerem até o inferno para aqueles que se negam a contribuir, nessa salada religiosa é dificil encontrar uma fruta que se possa aproveitar. ABRAÇOS

Anônimo disse...

Ora, reino dividido contra si mesmo não prevalece."

E sabemos que Jesus não se engana. Por que o espanto ?

O protestantismo se esfacela em 50.000 denominações divergentes entre si.

Então se cumpre: "Porque virá tempo em que os homens já não suportarão a sã doutrina da salvação. Levados pelas próprias paixões e pelo prurido de escutar novidades, ajustarão mestres para si.
Apartarão os ouvidos da verdade e se atirarão às fábulas."
2 Timóteo 4:3-4