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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

quinta-feira, 21 de abril de 2022

"O tal centro democrático é só uma falácia pobre"

É curioso como a classe burguesa e a classe política tratam o povo brasileiro. Por eles, a gente é tratado como desprovido do mais básico senso crítico, a ponto de essa classe política achar que pode falar e fazer o que quiser, já que o povo nem vai perceber as ideologias presentes no pensamento de nossos mandatários. Digo isso porque existe um movimento para tentar barrar o antagonismo entre Lula e Bolsonaro nas próximas eleições, sendo que tal movimento se autodenomina "centro democrático", mas que de centro tem só uma pequena parte. 

Os partidos que compõem tal grupo se dividem entre partidos de centro (como o MDB), de direita, (como o DEM, que, mais uma vez, troca de nome para tentar fugir da própria extinção) e de extrema-direita (como o PSL, antigo partido de Bolsonaro, e que agora se juntou ao DEM para criarem o União Brasil). Isso posto, o que se vê é um grupo que desloca as bandeiras e propostas políticas para segundo plano, se fingindo de homogêneo, e apresentando como de centro partidos que nunca foram de centro. 

Ainda que tal falácia tenha se estabelecido e que o povo praticamente não discuta espectro político, é interessante notar como tal grupo busca se fundir numa só candidatura ao Planalto, apresentando nomes como o de Luciano Bivar, presidente do União Brasil, ex-apoiador de Bolsonaro e ex-mandatário do já falecido PSL. Vale lembrar que Bivar é uma figura sem qualquer expressão para uma disputa de tal monta, além de, por tabela, ter sido o responsável pelo sepultamento da candidatura do ex- juiz Sérgio Moro, outro que está mais perdido do que cego em tiroteio. 

Sem Ciro Gomes e com nomes como Simone Tebet, André Janones, João Dória (será?) e Luciano Bivar, tal grupo nada e morre na praia, com figuras que não conseguem chegar a 3% nas pesquisas de intenção de voto, o que só pavimenta o caminho de Bolsonaro e Lula, sobretudo agora, sem a presença do ex-juiz de Curitiba, o que fez com que apenas Ciro ainda seja algum elemento de ameaça ao que já está dado, sendo que Ciro erra ao atacar tanto Lula, uma vez que deveria era tentar tirar a vaga de Bolsonaro no segundo turno antes de mirar sua artilharia no ex-presidente, que, sem um espectro amplo de candidatos competitivos, só precisará gerenciar os egos da esquerda brasileira, sobretudo os do próprio PT, a fim de derrotar o atraso que Bolsonaro representa. 

liberdade, beleza e Graça...


sábado, 19 de março de 2022

"A guerra que não se pode realmente conhecer"

A guerra da Ucrânia completou 3 semanas e é muito difícil entender o conflito, uma vez que os veículos da grande mídia brasileira parecem achar que todos somos tolos e manipuláveis, aliás, como sempre. Isso porque a impressão que se tem é a de que russos matam civis e ucranianos, não. Russos fazem o mal e ucranianos, não. A imagem vendida é a de que a OTAN - Organização do Tratato do Atlântico Norte, liderada pelos Estados Unidos, é desinteressada em algo para além da segurança de seus países-membros, o que nem de longe é verdade. 

Não sou pró-Rússia e sou antibélico radical. Detesto armas e estou certo de que seria preso por deserção, caso fosse convocado para qualquer tipo de conflito armado. Dito isso, é importante lembrar o historiador e cientista político estadunidense Benedict Anderson, quando este fala sobre a formação dos Estados Nacionais. Tal formação de cada estado-nação respeitando apenas fronteiras físicas é um dos maiores problemas da construção do mundo ocidental, segundo Anderson, dado que, tal como no caso da Rússia e da Ucránia, muitos estados respeitaram fronteiras físicas, mas não as étnicas, o que faz com que povos como os de Donetsk e Luhansk se sintam russos e falem russo, ainda que sejam obrigados, pela fronteira física, a se declararem ucranianos. 

É claro que a grande mídia não trata adequadamente dessa região de Donbass, pois não interessa discutir a razão de esses povos não se pretenderem ucranianos, interessando apenas tratar a região como "tomada por separatistas pró-Rússia", como se o povo de lá quisesse ser ucraniano, o que nem de longe se configura como verdade. Assim, não dá para se começar a compreender tal conflito sem se pensar sobre as diferenças étnicas contidas na região, o que essa mídia ignora completamente. 

Outra coisa muito importante a se pensar é o fato de que a OTAN, sob liderança dos Estados Unidos, sempre quis se impôr para além dos propósitos pelos quais ela foi criada. Hoje, como é possível ver, tal organização tem por objetivo maior cercar a Rússia, impedindo-a de continuar a ser considerada um país de bom trânsito no continente europeu e confrontando-a pelo arsenal militar nuclear ali contido, que é o maior do mundo, diga-se. Assim, os Estados Unidos, que, sem o aval da ONU, invadiram o Iraque, com a mentira de que lá havia armas químicas, e geraram crimes de guerra como os cometidos por soldados estadunidenses na prisão de Abu Ghraib, perto de Bagdá, se consideram os salvadores do mundo, sendo os russos os gênios do mal e reais criminosos de guerra. 

De tudo isso, enfim, o que se pode concluir é que ninguém é totalmente certo numa guerra e a propaganda sempre vai falar mais alto do que os fatos. Por conta disso, então, Vladimir Putin  não é mocinho e nem os Estados Unidos são os bons moços do mundo. Apenas são dois polos que se pretendem hegemônicos, ou aumentando o poder russo sobre as antigas repúblicas soviéticas, ou aumentando o poder da OTAN, no intuito de que quem não comunga dos atos estadunidenses devem ser considerados do "eixo do mal", ainda que nada se fale abertamente sobre outros acordos firmados na ONU, como o do território palestino, ocupado ilegalmente por judeus, muitos dos quais consideram antisssemita todos aqueles que lhes falam algumas verdades na cara. Que mundo é esse?!

liberdade, beleza e Graça...


quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

"Retratos de uma pandemia: Machado"

Hoje em dia, ao lecionar Sociologia, sempre me orgulho de um professor que tive no doutorado, mas que, infelizmente, não está mais entre nós. Luiz Antônio Machado da Silva, ou apenas "Machado", é daqueles caras que sempre serão lembrados, até porque os livros não me deixarão esquecê-lo. Prova disso é que, ao lecionar sobre violência urbana, sempre me deparo com o conceito que meu grande professor cunhou, o de "sociabilidade violenta", que agora serve de base para muitos estudiosos das Ciências Humanas e Sociais. 

Machado se foi para a Covid 19, em um momento em que o negacionismo do presidente e de seus defensores impedia que vacinas chegassem e salvassem nosso povo, mostrando a faceta mais cruel de um governo que nunca poderia ter chegado ao poder, dado o total descaso com a vida humana. Talvez os livros de Sociologia nunca tragam um conceito meu. Mas o do Machado está lá. E, como fui aluno dele, sinto-me como um filho intelectual. Assim, tal como no caso das obras de arte, os livros continuarão a manter o Machado vivo. A Covid matou mais um entre mais de 630 mil brasileiros. Mas as ideias ficam. 

liberdade, beleza e Graça...


sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

"Retratos de uma pandemia: cacetinho"

Ele era intérprete de surdos, professor de LIBRAS, além de ser pastor auxiliar em uma igreja no Vale do Paraíba. Como era obeso e estava longe da família, que mora em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, resolveu pedir umas férias à igreja e ficar perto da família até a pandemia acalmar um pouco, já que, para quem é do grupo de risco, estar perto de familiares e amigos de longa data é a melhor coisa.

Pegou Covid 19 justamente no sul do país, junto da família, e não resistiu aos efeitos perversos da doença. Não teve velório e nem os familiares puderam estar no sepultamento, por mais cruel que isso possa parecer. O pastor Edison, o Edinho, como era carinhosamente chamado, foi mais uma das quase 620 mil vítimas da Covid. Conheci-o no seminário, onde nos formamos em Teologia, e em raras ocasiões nessa vida eu vi alguém mais alegre e que alegrasse mais o ambiente. 

Estudamos na mesma sala de seminário e viajamos juntos uma vez, numa comitiva de 40 jovens fazendo trabalho voluntário no sertão do nordeste, onde ele era o motivo máximo da nossa gargalhada. A imagem dele brincando de hipopótamo a abaixar dentro da água de um riacho ainda está na memória, assim como o apelido de "cacetinho", que demos pelo fato de gente do sul chamar pãozinho francês dessa maneira. Que Deus te receba em festa, meu bom amigo!

liberdade, beleza e Graça...

 

terça-feira, 26 de outubro de 2021

"O mar e a ilha; Marília"

É curioso como a juventude nos faz tão abertos à criatividade, à arte. Muitos dos grandes poetas e escritores ofereceram suas obras mais sublimes em idades que pareciam não comportar tamanha genialidade. Penso que com Marília Mendonça a coisa se deu exatamente da mesma maneira, o que me faz pensar em pessoas que deixaram o melhor de si para a humanidade ainda adolescentes, do que é grande exemplo o poeta Arthur Rimbaud, que produziu suas obras mais famosas quando ainda era só um menino. 

Apesar do muito que se pode falar sobre Marília Mendonça, e dentro de uma classe intelectual que se nega a reconhecer a arte popular, pois a considera "menor", duas coisas me fizeram reparar nessa menina goiana que encantou o país e se foi com apenas 26 anos de idade. A primeira coisa que a classe intelectual se nega a enxergar é o lado positivo e encantador do apelo que obras como a de Marília têm sobre as pessoas e, a segunda, como isso impacta também movimentos sociais, como o feminista.

É inegável que Roberta Miranda abriu o caminho e veio enfrentar um estado de coisas muito mais hostil às mulheres, coisa que as lutas dos movimentos sociais evitaram que Marília enfrentasse. Todavia, Marília Mendonça tem méritos que justificam o status a ela dado em tão pouco tempo de vida e carreira, visto que conseguiu mobilizar duas frentes bem marcadas. A primeira é a que versa sobre a questão pessoal, com a autoestima, já que estamos falando de alguém que - assim como os irmãos Cézar Menotti e Fabiano - enfrentou o show business sem ter "o padrão estético adequado", uma vez que se tratava de uma menina obesa. A segunda frente é mais ampla, pois versa sobre as contribuições de Marília para o Movimento Feminista, mostrando que não é só do homem o direito de viver os amores da vida, tomar os licores da vida, narrar as peripécias amorosas vividas.

Ser obeso e encarar a exposição pública é algo que carece de muita coragem, já que, com a gordofobia espraiada por todos os cantos (e ela visitou "todos os cantos"), quase sempre a vergonha toma conta e a pessoa se torna uma ilha, isolada pelo oceano de críticas e julgamentos. Já, ter "a coragem de ser" (senteça que roubo de Paul Tillich), é se deixar virar mar, um oceano que vai levando tudo, como se fosse corriqueira a atividade de carregar o mundo consigo. Marília Mendonça conseguiu as duas coisas; a menina gorda deixou de ser ilha para ser mar. Foi mar, sem ter tido medo de contar que outrora fora ilha; foi - e para sempre será - Marília.

liberdade, beleza e Graça...  


(Ps: Minha homenagem à cantora e compositora Marília Mendonça, vítima fatal de um acidente aéreo no dia do meu aniversário, 05 de novembro. A data do texto aqui é anterior, pois eu estava devendo um escrito no blog).

quarta-feira, 29 de setembro de 2021

"Armai-vos uns aos outros"

Vendo dia desses uma manifestação em defesa do governo Bolsonaro, uma camiseta me chamou a atenção e me fez pensar profundamente sobre o estado de coisas atual, pensar sobre o lugar em que nos metemos enquanto famílias, cristãos, cidadãos etc. Isso porque a camiseta trazia o presidente fazendo o seu tradicional sinal de "arminha" e a frase que vinha abaixo era simplesmente chocante: "armai-vos uns aos outros", fazendo alusão a um texto bíblico bastante conhecido, o "amai-vos uns aos outros".

Confesso que essa sentença bolsonarista foi a segunda frase mais chocante que li nos últimos anos, sendo a primeira a de uma placa de papelão levantada em um semáforo por uma pessoa até bem vestida que dizia: "estou com fome". Eu nunca tinha visto alguém bem vestido dizer que estava com fome e, como era por volta de 14 horas, imaginei que o estômago daquele cidadão deveria estar já bem dolorido, pois sei como é ficar sem comer, visto que já tive também a experiência da fome. Ajudei.

Mas o foco agora é a frase da camiseta do manifestante bolsonarista. Pensei por muitos dias e decidi que talvez fosse interessante comprar uma camiseta daquelas e voltar a frequentar a igreja. Isso porque eu gostaria de olhar nos olhos das pessoas (e a igreja que eu frequentava tem em torno de 80% de bolsonaristas), no intuito de ver se alguma reflexão poderia surgir. Pensei que talvez a frase, sendo bem (re)lida e pensada, pudesse trazer à tona uma saída do surto, da catarse em que a igreja evangélica se meteu com esse governo, e que as pessoas pudessem, enfim, dizer: "cara, pensando bem, que burrada é essa? Onde nos metemos com esse apoio insano?

Isso porque uma reflexão detida acerca da frase obviamente deveria nos fazer sempre pensar sobre o que fizemos do Evangelho, da ética cristã, do amor expresso no Cristo Nazareno e da solidariedade que Jesus teimou em nos inspirar a viver. Perceber que trocamos a paz pela guerra, o amor pelo ódio e a solidariedade pelo individualismo e a violência contra o próximo, bem como perceber que anos atrás a gente não se odiava dentro da própria igreja, talvez isso nos faria perceber a furada em que nos metemos, ouvindo líderes como Silas Malafaia, que nem de longe deveria ser exemplo de vida cristã. 

O "armai-vos uns aos outros" é a síntese a explicar a maior parte da igreja evangélica brasileira, igreja da qual resolvi não mais participar, já que, independentemente das perdas sociais que tenho tido, ainda vale muito mais a pena ficar com a fala de Jesus, a "amai-vos uns aos outros", frase já banalizada e até esquecida pelos cristãos de hoje, tão impregnados pelo ódio que a família Bolsonaro e seus seguidores milicianos nos relegaram. Que Deus tenha piedade de nós e nos livre desse mal.

liberdade, beleza e Graça... 


quarta-feira, 25 de agosto de 2021

"Direitos trabalhistas: estão passando a boiada no Congresso!"

É já sabido que Jair Bolsonaro não agrada à maioria da população. Qualquer instituto de pesquisa diz isso, independentemente da possível linha ideológica de cada instituto, já que tais órgãos também representam segmentos da sociedade, como é o caso das pesquisas financiadas pela CNI - Confederação Nacional da Indústria, que, óbvio, terá sempre um olhar voltado para o empresariado industrial. A dúvida, então, é por que razão tal descontentamento não se transmuta em uma resposta efetiva do Parlamento.

A resposta parece ser simples: Bolsonaro e suas falas e posturas autoritárias e antidemocráticas são mera cortina de fumaça para que a burguesia brasileira toque para frente seu projeto de nação, que é o país como fonte de riquezas para uma pequena parcela, aquela que consegue jungir empresários, banqueiros e especuladores de bolsa de valores. Para esses, ainda que Bolsonaro seja uma besta, ele "deixa a boiada passar" na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, onde as pautas empresariais têm encontrado bom trânsito desde a posse daquele que a (agora) maioria desaprova. 

Em post antigo esse espaço defendeu que o estrago feito por Michel Temer, em termos de direitos trabalhistas, e só para ficar nesse exemplo, duraria 20 anos para ser consertado. Hoje, infelizmente, preciso afirmar que o estrago feito pelo bolsonarismo durará muito mais, com o risco de nunca mais deixar o país ser um espaço democrático e afeito ao contraditório. Se a burguesia brasileira se importa com isso? Parece que não, visto que até trabalho sem carteira assinada, sem férias, sem 13º salário e sem FGTS foi proposto por essa classe que nunca se cansou de enriquecer a si e massacrar a outrem. 

Se reclamam do fato do deputado Arthur Lira, presidente da Câmara, não pautar um pedido sequer de impedimento de Jair Bolsonaro, a resposta está no fato de que Lira tem conseguido colocar em pauta aquilo que interessa à classe que ele representa, e até faz parte. Sem impeachment e sem um debate sobre o que tem passado pelo Congresso, corremos o risco de jogarmos uma geração inteira no lixo, restando a nós programinhas como um "criança esperança" da vida, através do qual o empresariado mostra "sua cara bondosa", visto é que preciso uma cesta básica por ano para que a luta contra a desigualdade pareça estar se dando, mudando-se tudo para que tudo fique como está. 

liberdade, beleza e Graça...