Quem sou eu

- Cleinton
- Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.
domingo, 6 de maio de 2012
"Lugares comuns e o fantasma da inutilidade"
sexta-feira, 27 de abril de 2012
"O aniquilacionismo: teoria para um Javé menos irado"
A leitura assim posta é apressada, claro, pois ao atentarmos bem para algumas posturas e falas de Jesus de Nazaré, encontraremos resquícios de uma "genética que não nega a si mesma". Embora tenhamos construído um cânon dentro do cânon, a fim de ensinarmos apenas parte do que a Bíblia diz - e do jeito que a gente acha que ela realmente diz -, tal coletânea de livros nos apresenta um Jesus por várias vezes bem diferente do que querem as nossas leituras cerceadas. De resposta duríssima a uma mulher desesperada, por conta da possessão da filha - e à própria mãe, no episódio das bodas em Caná da Galileia! - a frases como: "Não vim trazer a paz, mas a espada"; "Não vim unir, mas separar pais e filhos, irmãos e irmãs", além do ato bastante irado de chicotear camelôs no templo, Jesus mostra aspectos de uma personalidade bem pouco explorada pelos nossos púlpitos. Talvez sejam estes os aspectos a justificarem uma concordância dele com a proposta "javista" de juízo, algo que, se bem analisado por nós, faz com que, no sentido que estamos aqui buscando elucidar, os dois sejam realmente um.
Entrando, então, no cerne do assunto que justifica o presente texto, falar de Javé é também falar de um Deus que preparou - desde antes da fundação do mundo, segundo relatos bíblicos - um dia de duríssimo juízo. Neste dia, conforme tais relatos, Jesus estará em pé, como justo juiz, tendo consigo o poder de, na presença de Javé, julgar todos os seres humanos de todas as épocas, lançando uma pequena parte num paraíso e uma imensa maioria num lugar que, para que a imagem seja bem fixada em nossas mentes, chama-se lago de fogo e enxofre. Lançadas neste lago, as pessoas que não tiveram seus nomes encontrados num livro de Deus - chamado de Livro da Vida - por não terem aceitado as propostas de Javé, na recepção a Jesus Cristo, serão perturbadas eternamente, sendo que o fogo infernal de tal lugar tem poder para queimar, mas não para consumir, uma vez que o intuito é que a danação não tenha mesmo um fim.
Discordando, porém, que Jesus e Javé tenham a mesma "carga genética irada", os teóricos do chamado aniquilacionismo se mostram descrentes em relação a tal postura de juízo e propõem alguns argumentos que buscam afastar Jesus de Javé - mas com outra possibilidade de leitura - mostrando aquele como realmente bom e este como irado, mas apenas enquanto "justificador de uma época bélica veterotestamentária". Como as épocas mudam, todavia, e tendo a postura amorosa de Jesus ganhado o mundo, convencendo-o quase que completamente acerca de uma ética cristã, já não caberia mais uma proposta de juízo tão radical, ficando o texto bíblico como uma alegoria, uma metáfora do que realmente seriam o céu e o inferno, haja vista o contexto histórico no qual o texto de Apocalipse foi produzido.
O aniquilacionismo defende, então, que haverá aniquilação dos indivíduos maus e de todos aqueles que não aceitaram a proposta divina de reconhecer Jesus como o Dei Verbum, a Palavra de Deus. Assim, tais pessoas serão totalmente destruídas, ficando eternamente aniquilado o mal. Mostrando, deste modo, uma "bondade divina", atrelada à incoerência de uma forma de castigo que refuta tal bondade, tal processo de aniquilação seria muito menos cruel, pois seria mais justo do que condenar à eternidade de danação alguém que pecou apenas por alguns anos, já que a vida na terra é curta demais. A frase que aqui poderia ser usada como ilustração é: "se pequei por 80 anos de vida, por que tenho de pagar eternamente?". Outro argumento aniquilacionista é o que entende que a presença eterna de criaturas más no universo prejudicaria a perfeição de um espaço criado para refletir a glória de Deus.
A proposta aniquilacionista, é importante lembrar, encontra justificativa até em alguns clássicos textos bíblicos. No entanto, tal proposta esbarra no mais duro adversário: assim como o universalismo - que apregoa amor divino incondicional e salvífico para todos os seres de todas as épocas, já que a manifestação plena do amor de Deus destrói todo o mal e convence convertendo a todos -, a proposta aniquilacionista não satisfaz à maioria dos religiosos, já que, para estes, muito mais interessante do que gozar a presença eterna de Deus no céu, é saber que poderão dizer "bem feito!" para a imensa maioria das criaturas perdidas neste mundo, às quais Deus tanto ama.
sexta-feira, 23 de março de 2012
"Os desigrejados: procura-se uma boa igreja. Procura-se bons pastores"
Falar de catolicismo no Brasil é falar de pelo menos duas importantes categorias: os católicos praticantes e os católicos não praticantes. Segundo levantamento da PNAD, corroborado pelo Censo, e pela vivência que experimentamos no cotidiano, a maioria dos católicos não vivencia sua fé com muita regularidade. Pelo menos nos grandes centros, a assiduidade se limita a eventos marcantes, ritos de passagem, como o são o batismo, a primeira comunhão, a crisma e o casamento.
Em termos de mundo protestante/evangélico, no entanto, para além dos ritos de passagem que sempre lotam as igrejas, uma categoria de análise a mais se nos apresenta: temos os evangélicos diretamente ligados a uma igreja (praticantes), temos os afastados (não praticantes), desiludidos por conta de alguma decepção eclesiástica, quase sempre ligada a problemas de relacionamento, e temos os que agora parecem estar bem mais “na moda”; os desigrejados (praticantes, mas sem líderes e sem um ambiente formal de prática).
Os desigrejados não são pessoas que se afastaram da fé. Não são pessoas que decidiram “chutar o balde”, caindo na gandaia do mundão, e fazendo tudo o que a igreja chama de pecado ou desvio da fé e conduta cristãs. Não, os desigrejados não são pessoas que estão abandonando os ensinos de Jesus Cristo, bem como não são pessoas decepcionadas com Deus ou com a Bíblia. Os desigrejados são simplesmente ovelhas que não têm pastor; é gente séria, procurando igreja séria, mas sem qualquer sucesso nesta empreitada.
Tais desigrejados surgem no início do século XXI, como resposta à polarização que se efetivou com muita força no mundo evangélico brasileiro da última década. Cansados de um neopentecostalismo avassalador – e de sua teologia da prosperidade – de um lado, e de um moralismo castrador, de igrejas demasiado conservadoras, de outro, os desigrejados formaram o grupo mais interessante do movimento evangélico contemporâneo, haja vista ter fomentado – e estar fomentando – uma série de reflexões acerca da caminhada da igreja evangélica brasileira.
Justamente por conta de uma séria reflexão sobre o seu lugar na igreja e no mundo, este grupo tem chamado bastante a atenção, uma vez que, ávidos por uma mensagem bíblica profunda e sincera (daquelas que não partem da premissa de que os ouvintes são idiotas alienados), aliada a uma relevância social num mundo deveras desigual e corrompido, os sem igreja se nos apresentam como um importante grupo a se conquistar.
Os desigrejados não estão em busca de prosperidade material e nem de milagres sem limites e a qualquer custo. Em geral, é gente com boa condição financeira e de saúde. Além disso, por conta da formação que conseguiram ter e pela reflexão que desenvolvem, essas pessoas pedem bem pouco de uma igreja e de um pastor. Assim, nem é tão difícil responder às suas demandas, pois rapidamente se pode enxergar a essência do cristianismo naquilo que tal grupo pleiteia, já que nossos irmãos pedem apenas um pastor que tenha ouvidos realmente interessados em ouvir e ombros realmente interessados em suportar o peso de uma ovelha, como quer o Evangelho.
Talvez já estejam em curso as estratégias para reintegrar tal grupo a uma comunidade de fé. No entanto, dogmatismos e intolerâncias sem limites não ajudarão em nada, pois a maioria dos pastores não tem a formação e as informações de que dispõem os desigrejados. Do mesmo modo, promessas mirabolantes não estão na ordem do dia, já que, para um desigrejado, papo de Malafaia, Valdemiro, Macedo, Miguel Ângelo, dentre outros, já se tornou, no mínimo, mensagem de procedência maligna.
liberdade, beleza e Graça...