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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

“Uma década de tiros em Columbine”

Há exatos dez anos, no dia 20 de abril de 1999, na Escola Columbine, em Litleton (Colorado), dois adolescentes fortemente armados de pistolas, rifles e muita munição mataram doze colegas e mais uma professora, dando, em seguida, cabo de suas próprias vidas. O cineasta estadunidense Michael Moore fez um excelente filme-documentário a respeito do massacre que chocou o mundo, marcando tristemente aquele abril sangrento.
Ao contrário do que quis outro fantástico diretor de cinema, o também estadunidense Gus Van Sant, com o maravilhoso “Elefante”, também sobre o mesmo massacre de Columbine, esse texto não pretende tratar da questão psicológica dos garotos assassinos, mas discutir a (in)segurança nossa de todos os dias e o porte extremamente facilidade de armas, nos Estados Unidos, que muitos entendem como solução para episódios como o lembrado aqui. Relembrar, já no título desse texto, a película “Tiros em Columbine”, de Moore, não é, pois, um expediente gratuito.
De lá para cá, vinte e oito novos massacres aconteceram nos EUA e a discussão que nos dias atuais se coloca é sobre a quem interessa o debate sobre o porte de armas. Fora os dois maravilhosos filmes – obrigatórios nas boas aulas de Sociologia – uma reflexão acerca do tema se faz extremamente pertinente.
O discurso, do qual faço parte, de que violência gera violência parece não fazer a cabeça de um sem número de cidadãos dos Estados Unidos, que se acham detentores de um direito divino (você não leu errado, eu disse divino!) de possuir uma arma de fogo e se “proteger”.
Larry Pratt, diretor da Gun Owners of America (Donos de Armas da América, em inglês), organização fundada em 1975 para defender o direito dos estadunidenses de adquirir e portar armas defende: “Nos EUA, nós temos a Segunda Emenda, que protege nosso direito, dado por Deus, de nos proteger com uma arma de fogo. Historicamente, a posse de arma de fogo foi exigida de todo homem livre, em todo nosso período colonial. Por 150 anos, na América, sob a Coroa Britânica, tivemos leis segundo as quais, se você era um homem livre, tinha que possuir um rifle e ir a uma milícia praticar. Quando a Constituição foi escrita, era isso que ela dizia. Que todos os indivíduos têm direito a rifles militares ou eles seriam multados. Havia punições para quem não tivesse armas”.
Justificando uma saída para os vinte e oito massacres desde Columbine, Pratt diz que “se alguém tivesse uma arma nesses locais, não haveria massacre, pois era só atirar e matar o possível assassino, antes que ele o fizesse com outros (...) violência resolve problemas”.
É sabido que a indústria de armamentos é extremamente lucrativa e não vai deixar de se impor num debate como esse. Todavia, é preciso concentrar esforços nos argumentos de cada lado, uma vez que, se Deus está do lado de lá, nós já perdemos do lado de cá.
Porém, é bom que saibamos que o conceito de liberdade, por mais amplo que possa parecer, não diz respeito a poder se armar, mas justamente não precisar de tal postura para se sentir seguro e liberto. Se a Constituição estadunidense defende ainda a liberdade de outro modo, é preciso que uma revisão conceitual se dê, pois os tempos e as mentalidades mudaram. Tanto assim é, que ninguém vai ser multado hoje por não ter um rifle!
Para serem mais honestos, pois, os defensores do argumento armado deveriam, pelo menos, mudar a argumentação, afinal, o que está em jogo não é o construto liberdade, mas a ganância da maior e mais lucrativa indústria do mundo capitalista. Quanto ao próximo massacre, que infelizmente virá logo, seguindo-se as estatísticas, eles que se virem por lá. Até porque, já temos muita corrupção, miséria, Daniel Dantas, José e Roseana Sarney, Fernando Collor e Gilmar Mendes para nos preocupar por aqui.

liberdade, beleza e Graça...

terça-feira, 14 de abril de 2009

“O novo império de Adriano na favela”

É difícil entender como uma pessoa que alcançou tudo na vida, morando em Milão e tendo todo o dinheiro e vantagens que um europeu bem sucedido possui, poderia trocar tudo isso por uma vida simples, andando de bermuda e descalço numa favela carioca.
Parece não ter a menor coerência a decisão do jogador de futebol Adriano, ídolo da Inter de Milão e da seleção brasileira, de “parar por tempo indeterminado”, por pura falta de motivação e por estar vivendo uma vida que não é a sua. Na cabeça de todos os que somos frutos de uma sociedade capitalista, que preza mais pelo ter do que pelo ser, isso é “coisa de maluco”. Todavia, não é tanta maluquice assim o que o jovem jogador apregoa para si.
O francês Émile Durkheim, um dos pais da Sociologia, cunhou o conceito de anomia. Anomia é o estado em que uma pessoa fica quando dos momentos de perda de referenciais; perda das regras sociais que o faziam sentir-se pertencente a um determinado grupo, concordando com este em suas práticas sociais. A anomia é, pensando na etimologia da palavra, a falta do nomos – palavra grega que pode ser traduzida por normas, regras, referências – uma vez que a partícula “a”, que vem jungida no início, tem a função de expressar negação. O indivíduo anômico é aquele que perdeu tais referenciais, portanto. Isso não é raro de acontecer com crianças, quando dos momentos de separação conjugal dos pais, por exemplo.
Adriano disse que saiu muito cedo do Brasil. Foi “retirado”, pois, daquilo que fazia sentido para ele. Foi “separado” de um grupo com o qual concordava desde sempre e enviado a um país onde a visão de mundo é completamente diferente. Entrou em contato com o estranho.
Perder “de forma proposital” tudo o que conquistou, em termos materiais, seria para muitos, um “suicídio econômico” da parte do jovem e ainda promissor jogador, e foi justamente numa obra chamada O suicídio que Durkheim conceituou estados psíquicos parecidos com esse que agora estamos tentando pensar.
Lançando mão de recursos estatísticos, o sociólogo francês percebeu que a taxa de suicídios na Europa do século XIX era muito maior entre pessoas solteiras, protestantes e não pertencentes a um grupo social determinado por regras fortes. Assim, chegou à conclusão de que a igreja católica romana, por ter regras bem determinadas de controle social, fazia com que o sentimento de pertença fosse mais forte do que no movimento protestante daquele momento, onde se apregoava justamente uma liberdade absoluta em relação ao antigo e dominador clero da cúria romana. O vínculo, ou a falta dele, em outras instituições sociais como a família, o serviço militar ou os clubes sociais de interesse também foram pensados como detentores de uma capacidade de gerar ou não anomia nos indivíduos.
Voltando à atitude do jogador, que é nosso objeto de análise, podemos pensar que o “suicídio” de Adriano – o econômico, claro, pois ele está, graças a Deus, vivo – nada mais faz do que corroborar a tese de Durkheim, uma vez que o jogador diz que “perdeu todas as certezas que tinha na vida”. Segundo suas próprias palavras: “a única certeza que sobra é a de que não deixarei de estar todos os dias na favela, andando de bermudas e soltando pipas descalço”.
Adriano é solteiro, pelo que consta não faz parte de nenhum grupo religioso ou clube social de interesse, acaba de perder um relacionamento no qual estava emocionalmente muito envolvido e tinha como único grupo social um clube num país distante e com pessoas de cosmovisão completamente diferente dos sonhos de um menino apaixonado por pipas e bailes funk de favelas. O argumento de Durkheim, portanto, se justifica e ajuda a explicar o evento.
E é por isso que não se deve ficar indignado, mas, ao contrário, respeitar atitudes como a do jogador brasileiro. Mais do que nunca, é hora de dizer, e sem demagogia: viva Durkheim e viva Adriano, o imperador da favela da Vila Cruzeiro!

liberdade, beleza e Graça...

sábado, 4 de abril de 2009

"Instalações poéticas"

Tempo de descobertas

Tempo de descobertas
O tempo. As descobertas
As descobertas do tempo
As descobertas no tempo
O tempo descoberto

Com o tempo, se descobre
E descobre-se no tempo
De tempos em tempos...
De descoberta em descoberta...
Pode-se descobrir as descobertas dos outros!
O que os descobridores descobriram!
O que estava coberto; encoberto

E, descobrindo-se, mostra-se em tempo
Pois, a tempo, tira-se a cobertura
Ainda em tempo, descobre-se-lhe
E tira-se o que encobria; a máscara
E mostra-se, permitindo descobrir-se
Num tempo onde nada fica encoberto
Descubra-se!


(Instalação poética escrita em homenagem aos 101 anos do Colégio Batista Shepard, no Rio de Janeiro, onde sou professor de Filosofia e Sociologia. O tema geral do Colégio Batista para 2009 é Tempo de descobertas).

liberdade, beleza e Graça...