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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

domingo, 23 de maio de 2010

"El secreto de sus ojos"

Sempre após a festa do Oscar é possível se ter uma noção de qual é o melhor filme do ano. Em geral, a película que ganha o prêmio de melhor filme estrangeiro é o melhor trabalho do ano, pois os estadunidenses não dão esse título a uma película que não seja produzida por seus patrícios. Para eles, o melhor filme terá sempre de ser o que das ideias deles saiu e ponto final.
Mas os bons cinéfilos sabem o que fazer assim que a festa termina; torcer para que o melhor filme estrangeiro chegue logo por essas terras, pois trata-se quase sempre do melhor trabalho cinematográfico do ano, sendo bem poucos os anos em que essa tese não se confirma.
Esse ano não foi diferente; o argentino "O segredo dos seus olhos" é disparado o melhor trabalho de cinema feito no ano passado. Com todas as honras, a película de Juan José Campanella é o melhor filme do ano e, nos dizeres de um cinéfilo de marca maior, é IMPAGÁVEL.
Desde "Clube da lua" que o ator Ricardo Darín entrou para o panteão daqueles intérpretes inesquecíveis. No 'quase romance' que vive com a personagem interpretada por Soledad Villamil, o Benjamín Espósito de Darín é mais um daqueles papeis que valem o ingresso e o incontido choro no final.
Guillermo Francella é outro que faz do filme algo de uma preciosidade de fazer calar. A música é perfeita, como sempre no cinema argentino, e a turbulenta e extremamente romântica Buenos Aires dos anos 1970 é trazida com uma minuciosidade, uma potência, uma poesia de fazer embasbacar.
A trama conta a história da tentativa do investigador de polícia Benjamín Espósito de escrever uma novela, sendo que nada nela será inventado, já que a pretenção é narrar algo de que ele mesmo foi protagonista anos antes. Tratar-se-á de uma história de amor, vivida em meio à investigação de um estupro seguido de assassinato, em que Espósito trabalhou, tendo o grande amigo, interpretado por Francella, como parceiro leal e amoroso, algo demonstrado sempre e até o fim de uma vida.
Espósito não consegue contar a própria história, pois ela é dividida com uma bela mulher casada, por quem ele sempre nutriu a razão de ser da novela que teima em não sair. O romance só será possível de ser concluído se o tal objeto de desejo vier a participar de maneira a fazê-lo, Espósito, compreender suas escolhas, ações, decisões e equívocos do passado. A busca não é, pois, por narrar, mas por compreender o passado e as escolhas feitas nele, a fim de que um amor que tinha tudo para acontecer explique a razão de nunca ter sido.
Só a partir do momento em que Benjamín Espósito decidir enfrentar a si mesmo, conseguirá atingir aquilo que deveria ter sido atingido 25 anos antes em sua história: encarar a mulher que ama, tendo a coragem de dizer a ela esse segredo guardado por 25 anos na fala, mas falado a cada novo dia na tradução, teimosamente não lida, do segredo dos seus olhos.
Correndo de forma paralela, a saga vivida pelas personagens de Pablo Rago e Javier Godino, viúvo e assassino, respectivamente, de uma mulher belíssima, ganham ares de tentativa de se explicar a verdadeira essência humana; a paixão que nos move a matar e a morrer, mostrando o pior e o melhor que cada um pode fazer, numa luta apaixonada de todos contra todos.
É por paixão que o assassino estupra e mata e é por paixão que o viúvo guarda uma vingança que nem o mais atento cinéfilo poderia imaginar, exceto se atentar desde o início da trama para o "método do paradigma indiciário", utilizado pela personagem de Francella.
Tal como o cego Tirésias, do clássico "Édipo Rei", o alcoólatra que Guillermo Francella vive consegue interpretar cada indício e sempre enxergar respostas, exatamente aonde os olhos pensam esconder segredos. Nada parece escapar à visão de alguém que é deixado à margem daquilo que o mundo sempre anunciará como "normal".
O final é um soco no estômago. Por isso, esqueça todo o resto e, por você mesmo, vá ao cinema!

liberdade, beleza e Graça...

segunda-feira, 19 de abril de 2010

“As grandes tragédias e o poder de isentar os verdadeiros culpados”

As épocas em que vivenciamos momentos dramáticos conseguem mostrar um poder ambivalente. Para o bem e para o mal, tais momentos trazem sempre possibilidades de reflexão e mudanças. Todavia, é curioso como quase sempre as oportunidades de se mudarem as estruturas nos escapam. E é essa a nossa grande infelicidade.
As tragédias do Morro do Bumba, do Morro do Céu e de outras encostas perigosas de Niterói e adjacências trazem à tona a reflexão sobre a tese que dá razão a este escrito; mais uma vez nos escapará a oportunidade de discutir e refletir acerca de um dos maiores males que o nosso tempo experimenta: a desigualdade social, que no caso de Niterói se mostra muito fortemente na especulação imobiliária e na impossibilidade de se cooperar para a instauração de um projeto de habitação popular decente.
De todas as coisas que foram ditas acerca das tragédias que vitimaram nossa cidade, a mais curiosa foi a frase que já parecia pronta nas bocas de um grande número de pessoas: “Mas por que será que essa gente vai construir suas casas justamente em cima do lixão?!”. O grande problema dessa mal-dita frase é que ela acaba por culpabilizar ainda mais àqueles que já perderam seus entes queridos – em alguns casos, famílias inteiras – juntos de todo o bem material que possuíam, e não sendo nenhum pouco fácil de recuperar, dadas as condições econômicas cada vez mais acachapantes da estrutura capitalista.
Por isso, embora pudéssemos citar grandes teóricos das Ciências Sociais, escolhemos trazer à tona a frase do eterno carnavalesco Joãozinho Trinta: “Quem gosta de pobreza é intelectual, pobre gosta é de glamour”. É esta a frase que deveria ser entendida por grande parte da nossa sociedade, que ainda acha que os moradores dos locais citados acima gostam de morar no lixo e o fazem por opção. Se sairmos a perguntar, encontraremos pobres querendo morar apenas em Icaraí, São Francisco, Charitas e outros bairros nobres de nossa bela cidade. A pobreza não é, pois, o sonho dos mais explorados e socialmente esquecidos.
Aos intelectuais – exceto os “orgânicos”, na teorização de Antonio Gramsci, pois são militantes e ativamente participantes dos dramas dos mais desvalidos – parece mesmo caber apenas continuar a viver da possibilidade de teorizar acerca da pobreza alheia.
O que parece ser ainda pior neste drama todo é a impossibilidade de se falar nos verdadeiros culpados. Ter um governador que, se dizendo emocionado, defende que “não é hora de procurar culpados” é mesmo uma contradição. O argumento da emoção parece ter força para isentar quem precisa ser punido! Mas como não procurar os culpados e saber das razões de suas culpas, se outras tragédias poderão vir justamente por conta do mesmo drama social?
Sim, há um culpado; em um outro governo foi feito um estudo que condenava a área que ulteriormente viria a ser urbanizada pelo governo atual, que não deu a menor atenção ao laudo científico deixado pelo governo opositor. Será que não há culpados aí?
Ainda querendo culpar os mais pobres, alguém disse que foi feito um convite para que muitas famílias se mudassem para uma localidade muito distante, a fim de que pudessem estar em segurança, mas muitas não quiseram. Acontece que morar longe do trabalho é outro problema, já que os mais ricos não gostam de contratar gente que mora longe. Poucos falam acerca disso, mas não são poucos os que perdem as possibilidades de se empregarem, visto que moram em localidades muito distantes e gastariam muito tempo e dinheiro de transporte para chegarem ao trabalho. É o famoso “morar mal”. Quem mora longe dos ricos mora mal, tanto quanto quem mora perto, mas nas encostas. É um drama a ser discutido e resolvido ainda.
Para tornar ainda mais trágico o texto aqui apresentado, é lamentável ver pastores (e não são poucos) que abrem a Bíblia e encontram razões para acabar com o resto de esperança dos mais empobrecidos, ao lerem "interpretando"- e culpabilizando novamente os já des-graçados dessa estrutura desigual - textos como: “O que constrói sua casa sobre fundamento não sólido sofrerá com as enchentes e é isso o que os pobres estão fazendo”. Este texto nada tem a ver com construção material e a Palavra de Deus tem coisas belíssimas a serem lidas neste momento e a servirem de consolo a todos.

liberdade, beleza e Graça...

sexta-feira, 2 de abril de 2010

“Freud, AIDS e religião; tudo junto, numa articulação por Romanos”

Uma das questões mais intrigantes na vivência da religiosidade cristã – e talvez também de muitas outras vivências religiosas, das quais temos menos conhecimento – sempre foi a razão para que uma pessoa fosse desligada de uma determinada comunidade de fé. Por anos e anos o único motivo que justificava um desligamento era, por incrível que hoje possa parecer nos grandes centros, a gravidez fora do casamento. Em geral então, os adolescentes e jovens eram as maiores vítimas deste doloroso processo. Embora a crença cristã não faça diferenciação entre um pecado e outro, ainda não se tornou pública uma exclusão por causa de fofoca, inveja ou outro pecado “mais brando”, o que parece ser sim uma contradição.
A leitura da obra de Sigmund Freud, pai da psicanálise, talvez ajude a explicar porque o sexo e as questões inerentes à sexualidade sempre conseguiram ter tanta força entre os religiosos, sejam eles cristãos ou outros.
Freud entende que o básico da existência humana está ligado aos traumas e perdas na primeira infância e às pulsões sexuais que, em maior ou menor medida, são recalcadas ou sublimadas para que uma vivência “mais decente” se dê no mundo da vida. Deste modo, as fases genital e de descoberta da sexualidade, que tanto assustam a alguns adultos, por conta de mostrarem que o ser humano vai “cedo demais” aos lugares onde só se deveria ir na vida adulta, foram um importante foco de estudos do pai da psicanálise.
A força da questão sexual também é apresentada na Bíblia. A carta do apóstolo Paulo aos romanos mostra algo que nos faz pensar nisto que já foi apresentado como obra e tese de Sigmund Freud em finais do século XIX e início do XX; a sexualidade é mesmo foco de importância capital também no livro sagrado dos cristãos. Tanto assim é, que o primeiro capítulo de Aos romanos mostra que a forma que Deus usou para apresentar a sua decepção com um grupo de pessoas desobedientes foi a “entrega destes às suas próprias paixões sexuais, deixando surgir até relações entre mulheres e mulheres e homens e homens”. A homossexualidade estava, pois, posta para a crítica ulterior.
Nos anos 1980, quando a AIDS chegou, desconhecida e assustadora, o texto de Romanos foi utilizado por vários segmentos religiosos para transformar os gays em uma "maldição do século", responsáveis diretos pela mão de Deus que estava então “pesando sobre a humanidade”. Não foram poucos os que ligaram a doença até então implacável ao texto do primeiro capítulo de Romanos.
Hoje, embora um participante de um destes chamados shows de “realidade” tenha afirmado que "a AIDS é coisa só de gays”, é sabido que a doença é coisa de muita gente séria, que contraiu o vírus desde o nascimento, por exemplo, e também de gente desprevenida e com parcerias sexuais irresponsáveis. Nos anos 1980, os gays foram entendidos como “o grande mal” por conta do desconhecimento em relação à nova doença e por conta do número de parceiros que em geral tinham. Contudo, já é sabido que, sendo homo ou sendo heterossexual, o número de parceiros e a irresponsabilidade continuam a ser os elementos básicos a se culpar.
Enfim, o que a nossa leitura hoje da Bíblia mostra é que Freud tem sim razão, pois, entregues aos seus próprios desejos e paixões, os seres humanos investem logo num ponto que para Freud e para Paulo é um ponto nevrálgico: a sexualidade, com todas as possibilidades que ela oferece, agradando ou não ao chamado caráter divino.
É bom lembrar, no entanto, que o foco desta parte de Romanos é a idolatria. É por causa da troca de Javé por outros deuses, adeptos do culto ao corpo e da fertilidade sexual, que o tal “abandono de Deus” se deu. Mas aí o assunto já ficaria longo demais.

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domingo, 14 de março de 2010

“Caminhos da espiritualidade”

O terceiro capítulo do Evangelho segundo São João talvez seja o trecho mais conhecido da Bíblia. Isso porque nele está contido o versículo chamado de Bíblia-mirim, João 3:16, onde se lê: “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”.
O que foge à atenção, no entanto, é que o contexto para que tal máxima surgisse era também deveras interessante. Este curioso capítulo bíblico conta a história do encontro entre dois sábios rabinos: Nicodemos, um fariseu, doutor da lei mosaica e chamado de “príncipe dos judeus”, e Jesus, um filho de carpinteiro que ganhava notoriedade por conta de uma série de sinais miraculosos que fazia e por palavras de teor extremamente revolucionário para aquele momento histórico.
O texto diz que tal encontro se deu à noite por opção do próprio Nicodemos. A leitura sempre apresentada é que a escolha do horário dizia respeito a um possível medo ou vergonha da parte de Nicodemos, visto que ele era um rabino reconhecido socialmente e procurava encontrar-se com um rabino marginal ao sistema, o que viria a depreciá-lo com certeza.
Todavia, é possível uma leitura um tanto diferenciada, contemplando o gesto do “príncipe dos judeus” como algo que se deve seguir. É importante levar em conta que as visitações noturnas não eram comuns naquele tempo, visto que a possibilidade de saques e assaltos era uma constante. Assim, pensar que Nicodemos subverte uma ordem social para ter um tempo a sós com Jesus pode trazer a um mais atento leitor um ligeiro contentamento.
O texto segue mostrando as razões da busca de Nicodemos; tal rabino queria saber como Jesus fazia o que fazia, onde tinha aprendido palavras tão sábias, visto que não havia frequentado as escolas teológicas mais conhecidas da época (a de Hilel e a de Shamai) e como adquirira aquela postura carismática de fazer inveja a qualquer grande líder. A chegada de Nicodemos, portanto, enfatiza aquilo que ele via de místico em Jesus. Seguindo esse pensar, é também importante ver que Nicodemos humildemente reconhece Jesus como “mestre vindo da parte de Deus, pois ninguém faz o que Jesus faz se Deus não estiver com ele”.
Ao entender as razões de Nicodemos, Jesus lança mão de uma frase que vai inquietar tal rabino por um longo tempo: “Quem não nascer de novo, da água e do Espírito, não pode ver o reino dos céus”. Na cabeça de um intelectual, doutor de sua época, isso não fazia o menor sentido, pois, como o próprio Nicodemos diz: “É impossível para um ser humano voltar ao ventre materno e nascer novamente”. A ciência realmente negaria isso em qualquer tempo.
O nascimento espiritual continua mesmo a inquietar gerações. Mesmo com a “profecia” iluminista de que o século XX apresentaria o fim absoluto da religiosidade, foi possível ver que o inverso se deu, num processo sociologicamente chamado de reencantamento do mundo. Ao contrário do que se previa, os seres humanos nunca buscaram tanto uma esfera “encantada”, uma dimensão espiritualizada, como nos séculos XX e XXI.
Jesus continua a inquietar e a ser fonte de respostas para quaisquer pessoas. No entanto, para que um contato mais estreito com ele se dê e para que o coração de um ser humano possa ser realmente preenchido pela presença oceânica do Cristo, é preciso que uma subversão da ordem social se dê. É preciso também que uma humildade de reconhecer Jesus, um líder ainda marginalizado pelo conhecimento científico, se estabeleça, e que a busca não seja apenas por conta de sinais maravilhosos ou o carisma que ele tem, mas por causa da revolução do pensar e da mudança de mentalidade – para muito melhor, diga-se – que ele consegue provocar em qualquer pessoa.
Fazendo isso, qualquer um pode experimentar o verdadeiro gozo do espírito e uma paz que o mundo não oferece, pois nunca a conheceu. Só assim será possível descansar realmente em Deus, aquietar o espírito e, consequentemente, nascer de novo.

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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

“Na era dos direitos, alguns não têm direitos”

É chato ficar batendo na mesma tecla sempre, pois fatalmente corre-se o risco de se parecer um fomentador do chamado "patrulhamento ideológico", o que este espaço nunca pretendeu referendar. Contudo, é importante trazer à tona - e mais uma vez, pois nesta página já há três textos sobre a temática - a questão do direito dos homossexuais e dos que deles se distinguem. Sendo várias as razões para que tal tema volte a figurar este espaço, citaremos algumas.

- No dia 31 de julho de 2009, o Conselho Federal de Psicologia decidiu aplicar censura pública à psicóloga carioca Rozângela Alves Justino, que oferecia terapia a pessoas homossexuais que a procuravam em busca de ajuda para largar o homossexualismo.

- No dia 5 de agosto de 2009, a cantora Cláudia Leitte foi chamada de homofóbica por ter declarado que gostaria que seu filho recém-nascido fosse heterossexual.

- Em janeiro de 2010, o programa da Rede Globo Big Brother Brasil escolheu três homossexuais declarados para participarem do jogo e entre suas atividades, que alguns entendem como “um papel social relevante para vencer-se a discriminação”, está o tomar banho de sol e piscina nus, sem qualquer preocupação com o horário em que pessoas de todas as idades assistem tevê, e ensinar como se faz sexo oral, tanto em homens como em mulheres, também sem qualquer preocupação com o público que lhes dá atenção.

- No dia 4 de fevereiro de 2010, o senador Eduardo Suplicy acionou o Senado Federal, no intuito de enquadrar o general Raimundo Nonato de Cerqueira Filho, candidato ao Superior Tribunal Militar, que tinha declarado no dia anterior - falando sobre a postura pública de um homossexual - que em sua opinião particular, "a vida militar se reveste de características que podem não se enquadrar em quem tem esse tipo de comportamento”. O general afirmou ainda, corroborando a fala do almirante Álvaro Luiz Pinto, que a questão não seria o homossexualismo em si, mas uma “postura que pudesse aparecer” e o fazer (o militar homossexual comandante) ter dificuldades em comandar, já que os liderados não obedeceriam, uma vez que ele, o general, teve conhecimento de que em vários exércitos isso se dera. Se não aparecesse a “postura”, não teria qualquer problema, segundo suas palavras, que se equipararam com as do almirante Álvaro Pinto: “Não tenho nada contra, desde que mantenham a dignidade da farda, do cargo e do trabalho. Se ele mantiver a sua dignidade, sem problema nenhum. Se for ferindo a ética, aí eu não seria a favor”.

Sabemos dos sérios riscos em se escrever o que agora escrevemos, todavia, o que sempre se procurou aqui foi que a luta pela liberdade de expressão se desse, inclusive para aqueles que de forma bem particular se colocam no mundo social. A Constituição Federal garante isso a todos.
Assim, não vemos problemas em mostrar nossa insatisfação com a postura de patrulhamento ideológico imposto, que tem feito com que quem não pensa consoante àquilo que se estabeleceu como “politicamente correto” não seja bem aceito.
Os homossexuais têm os seus direitos, mas quem não é também tem o direito de rechaçar posturas como as que a Rede Globo vem mostrando como “a última moda”.
Se a Rede Globo e os patrulhadores de plantão não puderem respeitar os direitos alheios, não poderão pleitear direito algum, visto que o que se tem apresentado é a ratificação de uma postura contra todo o preceito democrático. Se a coisa continuar como está, viveremos não uma democracia plena, mas um pleno estágio infernal do “politicamente correto”.

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sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

“Paralelos teológicos”

Karl Barth foi um teólogo nascido na Basiléia, na Suíça, sendo um dos maiores de que se tem notícia na história da Teologia, visto ter trazido contribuições demasiado importantes para o debate e reflexão acadêmicos pelo viés da Teologia Dialética e da chamada Neo-ortodoxia protestante (corrente de pensamento que tanto me encantou nos meus cinco anos de academia teológica).
É de Barth a matriz para o chamado “pensamento universalista”. Segundo tal pensar, grosso modo, o amor de Deus é tão intenso e incomensurável, que não haveria a menor possibilidade de o Mal subsistir, quando do momento da manifestação plena de tal amor. É como se, na presença do amor magnificente de Deus, o mal fosse de todo aniquilado e o inferno saqueado e destruído.
Lembrei-me de Barth e de meus anos de academia teológica ao acessar o livro bíblico de Jonas e ao lançar mão de uma “frase universalista” em um meu cartão de visitas.
Relendo o livro do “profeta menor” Jonas, certifiquei-me mais uma vez de que se trata de um libelo contra a segregação étnica e pela universalização do acesso ao Deus criador. É interessante notar que a pregação de Jonas, que acabou por converter os grandes pecadores de Nínive (na época, uma “cidade cuja maldade já tinha chegado aos céus”), longe de ter felicitado o profeta, o desencantou em demasia, pois o mesmo estava nenhum pouco interessado em que outra etnia, que não a sua, alcançasse a misericórdia do Deus de toda a criação.
A visão exclusivista de Jonas, no meu modesto entender, nada mais é do que uma versão judaica antiga da atual visão exclusivista de vários segmentos religiosos, evangélicos dentre eles. Tal visão acabou por fazer do povo judeu um grupo perseguido, odiado e segregado por outros e até por si mesmo. O mesmo parece estar acontecendo com todo o grupo que, de forma segregadora e intolerante, se posiciona como uma nação “fora do mundo”.
A frase de cunho “universalista” que postei em meu cartão de visitas diz: “A derrota cabal do Mal será que, ao abrir as portas do inferno, ele o encontrará vazio, por causa da Cruz de Cristo”. Assim como a conversão dos ninivitas, que tanto irritou ao profeta Jonas, por conta de seu exclusivismo segregador, minha frase também irritou ou, no mínimo, chocou um bom número de pessoas cristãs “piedosas”.
“Mas, pastor, assim não vai ter inferno, poxa!”. “Então, vai ser todo mundo salvo, pastor?!”.
Não nego a existência do céu e do inferno, embora pouco eu possa falar sobre eles. Todavia, o que assusta não é o fato de a Bíblia os fazer existentes – ainda que tenham tido as mais variadas leituras no decorrer dos anos – mas o fato de que o inferno precisa existir; tem de ter gente lá!
Para o profeta Jonas, os ninivitas não poderiam se converter a Deus. Eles teriam mesmo de ser destruídos e queimados vivos! Da mesma maneira, a frase de cunho utópico cristão que postei acabou por ser lida como um “libera geral” não-punitivo. E isso, tristemente, desencantou.
A simpatia à Neo-ortodoxia protestante me fez olhar com bons olhos para a visão universalista de um amor que aniquila todo o mal e instaura o bem para sempre e para todos, mas isso tem um alto preço, é óbvio. Noutra época, levaria à fogueira!
Ainda assim, e no nível da provocação, pergunto: a vontade de Deus poderia não ser feita? Diz a Bíblia que “a vontade de Deus é que todos se salvem” e que essa mesma “vontade de Deus é boa, perfeita e agradável”. A questão mais provocadora e que não calará, pois, é: Para você, é bom, perfeito e agradável que a maioria da imagem e semelhança de Deus queime eternamente num espaço de flagelo e dor incessantes?
Não radicalizei, refutando as ideias bíblicas de céu e inferno, mas gostaria que, ao menos, minha frase universalista fosse lida como uma utopia cristã a ser buscada, ainda que utopia. Pode até ser que não aconteça, mas minha vontade também é que todos se salvem.
FELIZ 2010.

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quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

“Enunciados do Enem, textos longos e livros grossos”

Interessa-me muito o noticiário sobre a avaliação anual que o governo federal promove para o ingresso em universidades, pois dela depende a inserção de muitos brasileiros pobres – com um contingente bem significativo de negros e negras – no ensino superior deste país.
Das notícias referentes ao “evento Enem”, porém, a que mais me chamou a atenção não foi a do roubo do primeiro lote de provas, meses atrás, mas a da reclamação dos candidatos, quando afirmaram, após as provas, que “os enunciados eram muito longos e cansativos”.
Para um país onde as instituições de ensino em sua maioria estão acostumadas a uma educação bancária, seguindo o conceito de Paulo Freire, é triste perceber que os educandos não estão acostumados a outra coisa, senão ao “senta aí que eu te ensino, pois eu sou professor e você é só um a-luno” (o hífen é proposital).
A educação, portanto, acaba por ser algo onde os educandos se preocupam muito em ter a resposta curta e “na ponta da língua” – incutida bancariamente pelo professor –, mas não ter espaço algum para uma reflexão em profundidade. Ainda tenho em memória algumas “respostas prontas e certas” de tempos passados: “Quem descobriu o Brasil?”. “Pedro Álvares Cabral” (na época não havia controvérsia). “O que é matéria?” “É tudo o que existe e ocupa lugar no espaço” (também não havia controvérsia) etc. Eu estava certo?
Parece que sim, pois fui sempre aprovado e consegui chegar ao ensino universitário assim. Mas a coisa precisou mudar. Confesso, porém, que “a coisa” só mudou na universidade, por conta da escolha por uma carreira onde a crítica é imprescindível. Se assim não fosse, não sei, não.
Mas voltando ao tema do presente texto (e preciso terminá-lo antes do meu “normal de linhas”, para não ter “problemas”), muitos dos meus alunos reclamaram que “os textos do deste blog são muito longos, passando de 15 linhas!”.
Adicionado a isso, ouvi de alguns outros: “Professor, indica livros finos, pois livro grosso ninguém merece!”. Ao fim e ao cabo, não sei se choro, lançando cinzas sobre a cabeça, ou se tento “angariar novos leitores”, escrevendo textos que não ultrapassem 15 linhas.
Ih, “infelizmente”, já passei de 15 linhas; só me resta mesmo vestir panos de saco, jogar cinzas na cabeça e chorar profundamente.

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